Wladimir Bocca Vieira de Rezende Pinto
Conselheiro da ABrELA
Nas últimas três décadas, diversos estudos clínicos e experimentais foram realizados com o objetivo de se desenvolver novos tratamentos medicamentosos que possam junto ao manejo e suporte multidisciplinar modificar o curso natural da doença e proporcionar melhor controle dos sintomas relacionados à doença e, assim, melhor qualidade de vida aos pacientes.
Os tratamentos medicamentoso na ELA podem ser divididos em duas grandes modalidades: (i) tratamento medicamentoso sintomático; e (ii) tratamento medicamentoso específico (ou modificador de doença). Os tratamentos medicamentosos sintomáticos objetivam o controle de sintomas decorrentes propriamente da doença ou secundários a disfunções dos diferentes sistemas pela doença, podendo proporcionar melhora de desconforto e uma melhor qualidade de vida aos pacientes. Os tratamentos sintomáticos não são capazes de modificar o curso natural da doença ou a sobrevida sintomática relacionada à doença de base. O conjunto de medidas medicamentosas ou não relacionadas ao suporte sintomático representa pilar dentro dos cuidados paliativos em qualquer paciente com uma doença neurológica crônica incurável, como na ELA, na doença de Parkinson, na doença de Alzheimer e na doença de Huntington. Alguns dos principais sintomas e sinais que são abordados na terapia sintomática incluem: sialorréia (hipersalivação), dispneia, tosse, insônia, fadiga, dor, constipação intestinal, anorexia/inapetência, sintomas depressivos, e sintomas de afeto pseudobulbar (riso e/ou choro imotivados).
A sialorreia representa condição extremamente comum na evolução de pacientes com ELA, especialmente nos casos de início bulbar, nas formas de rápida evolução e na variante Paralisia Bulbar Progressiva. Alguns dos métodos de tratamento incluem: colírio de atropina 1%, tópico oral, 1-2 gotas, 3-4 vezes ao dia, ou conforme demanda; nos casos refratários, podem ser indicados o uso de agentes com efeitos anticolinérgicos, como a amitriptilina, 25-50 mg/dia, a hioscina (0,3 mg, 3x/dia), o glicopirrolato, 1-2 mg, 4/4 horas, a propantelina, 15-30 mg, 4/4 horas, e patches de escopolamina. Nos casos super-refratários, mesmo com otimização das medidas descritas previamente, pode ser feita aplicação da toxina botulínica nas glândulas parótidas e submandibulares ou irradiação (em baixa dose) das mesmas glândulas.
A inapetência (ou hiporexia/anorexia) é sintoma bastante frequente nas fases moderadas e mais tardias da doença, podendo ser tratada com uso da dexametasona, 2-4 mg/dia, em usos curtos, ou de outras drogas para tratamento de sintomas associados (como procinéticos, metoclopramida, melatonina, agentes progestágenos). A constipação intestinal pode ser tratada com o uso de lactulose, 10-20 mL, via oral, até 3-4x/dia, além de dieta laxativa, melhora da hidratação e uso de fibras (metilcelulose).
A tosse pode decorrer no paciente com ELA de diferentes fatores e causas, como infecções sinopulmonares recorrentes ou disfagia orofaríngea grave. Assim, a identificação de um fator etiológico é fundamental. Nos casos associados, à progressão da doença de base, podem ser utilizados: agentes antitussígenos (carbocisteína), corticoides (via enteral), e inalação com agentes anticolinérgicos.
Os sintomas de afeto pseudobulbar podem ser tratados com uso do dextrometorfano, 30 mg, ou da associação deste com quinidina, ambos de difícil aquisição em nosso meio, sendo potencialmente adquiridos sob demanda de importação. Alternativas eficazes incluem o uso da fluvoxamina, de sertralina ou de fluoxetina, na dependência do perfil de cada paciente. O tratamento de sintomas depressivos pode ser feito através do uso de drogas classicamente empregadas em pacientes sem doenças neuromusculares, como amitriptilina, nortriptilina, imipramina, citalopram, fluoxetina, sertralina, paroxetina, venlafaxina, bupropiona; todos estes ou alternativas optados, conforme indicação ou perfil clínico de cada paciente. Para tratamento da insônia inicial, podem ser utilizados a trazodona, o zolpidem e benzodiazepínicos. Para tratamento da insônia terminal, podem ser empregados antidepressivos tricíclicos, como a amitriptilina.
A fadiga muscular em alguns pacientes pode ser tratada, conforme perfis clínicos específicos, com o uso de drogas como modafinil, 100-300 mg/dia, amantadina, 100-200 mg/dia, e L-carnitina, 2 g/dia. A dor pode ser tratada, conforme cada perfil clínico de paciente e de sintomas, com o uso de analgésicos simples (dipirona, paracetamol), anti-inflamatórios não-hormonais, carbamazepina, gabapentina, amitriptilina e analgésicos opióides. Já as câimbras podem ser tratadas pelo uso de sulfato de quinino, 325 mg, 2x/dia (em doses variadas caso a caso), benzodiazepínicos (clonazepam, diazepam), carbamazepina, fenitoína, e gabapentina. No contexto da associação com espasticidade, podem ser utilizados o baclofeno e a tizanidina, de forma adjuvante.
Os tratamentos medicamentos específicos (modificadores de doença) incluem terapêuticas que possam modificar o curso natural da ELA. Até o momento não há a disponibilidade de terapêuticas curativas relacionadas à doença, ou seja, que consigam reverter os sinais e sintomas já estabelecidos da doença. O objetivo atual das terapêuticas específicas é a lentificação do curso e da história natural da doença. Tais tratamentos não necessariamente são capazes de promover melhora do bem estar e de qualidade de vida nos pacientes com a doença. A única droga atualmente disponível em nosso país com potencial e capacidade de modificar de forma discreta a sobrevida e desfechos ventilatórios relacionados à doença é o Riluzol. Os mais de 20 anos de prática clínica tornam o Riluzol, a droga ouro de escolha no tratamento da doença, apesar de seu impacto clínico modesto na história natural da doença. A dose habitual empregada é a de 50 mg, via oral/SNE/GTT, 2 vezes por dia. Piora de fadiga, sintomas gastrointestinais (diarreia, dispepsia) e sintomas vestibulares (tontura) são comumente observados nas primeiras semanas de uso da droga e geralmente cessam com o uso após período inicial de adaptação. A metilcobalamina vem sendo utilizada em alguns centros especializados no tratamento da ELA, devido a seus resultados promissores em estudos preliminares, apesar de maior número de pacientes ser necessário para o emprego rotineiro na assistência clínica de pacientes com ELA. Deve ser utilizada metilcobalamina (25 mg/mL), 2 mL/ampola, via intramuscular, 2 vezes por semana. Não há evidência de benefício clínico ou comprovação do mesmo no uso da medicação por via enteral (oral, GTT). Vale lembrar que o princípio ativo é distinto da cianocobalamina, frequentemente utilizada no tratamento da deficiência de vitamina B12 em idosos. O Edaravone representa droga recentemente aprovada em 2017 nos EUA para tratamento de pacientes com ELA em fases iniciais da doença, sem envolvimento ventilatório significativo e sem envolvimento motor grave ou maior incapacidade pela doença. Os efeitos do uso do medicamento foram modestos e ainda é desconhecido o impacto que a associação de tal droga no tratamento adjuvante com as demais drogas possa ter na evolução da doença. Não é droga ainda disponível em nosso meio para tratamento da ELA.
Outras drogas vêm se mostrando extremamente promissoras no tratamento da ELA, como o Masitinib (com resultados de fases 2 e 3, altamente positivos no seguimento clínico inicial dos pacientes), e a L-serina. Mais de 10 drogas adicionais encontram-se em fases de estudos clínicos iniciais (I, II) e finais (III). Nas formas familiares da ELA relacionadas aos genes SOD1 e C9orf72, há estudos baseados na terapia com oligonucleotídeos antisense em andamento e que se mostram bastante promissores, apesar de serem direcionados especificamente aos casos de pacientes com a doença familiar relacionada a mutações em tais genes. Não há estudos clínicos randomizados que tenham demonstrado até o presente momento benefício no emprego da terapia celular com células-tronco embrionárias ou células-tronco neurais no tratamento da ELA, existindo alguns estudos relacionados ao uso de células-tronco mesenquimais com tal finalidade. Medicamentos utilizados para outras formas de Doença do Neurônio Motor, como a Amiotrofia Espinhal ligada ao SMN1, possuem estudos clínicos especificamente direcionados a tais doenças e são programados às alterações genéticas relacionadas a tais doenças e não à ELA, não podendo assim ser empregados no tratamento de pacientes com ELA. Os principais estudos clínicos que foram realizados e que se encontram em atividade no momento podem ser encontrados no seguinte link: